«Mas em todos os assuntos sobre os quais a diferença de opinião é possível, a verdade depende de um equilíbrio a ser atingido entre dois conjuntos de razões que estão em conflito. Até na filosofia natural há sempre outra explicação possível dos mesmos factos; uma teoria geocêntrica em vez de uma teoria heliocêntrica; um flogisto em vez de oxigénio; e tem de se mostrar por que não pode outra teoria ser a verdadeira: e até se mostrar tal coisa, e até que saibamos como é mostrado, não percebemos os fundamentos da nossa opinião. Mas quando passamos para assuntos infinitamente mais complicados, para a ética, a religião, a política, as relações sociais e os assuntos da vida, três quartos dos argumentos a favor de cada opinião controversa consistem em dissipar as aparências que favorecem uma qualquer opinião diferente dela. [...] O que Cícero fazia para alcançar sucesso retórico precisa de ser imitado por todos os que estudam qualquer assunto de modo a chegar à verdade. Aquele que conhece apenas o seu lado da questão, sabe pouco acerca do seu lado. As suas razões podem ser boas, e pode ser que pessoa alguma tenha sido capaz de as refutar. Mas se ele é igualmente incapaz de refutar as razões do lado oposto; se nem sequer sabe quais são, não tem quaisquer fundamentos para preferir qualquer das opiniões. A posição racional para ele seria a suspensão do juízo, e, a não ser que se contente com isso, ou é conduzido pela autoridade, ou então adopta, como a maior parte das pessoas, o lado para que está mais inclinado.»
John Stuart Mill, Sobre a Liberdade. Lisboa, Edições 70, 2006, pp. 78-79.
12 comentários:
A meu ver, ao olharmos o que nos rodeia desenvolvemos sempre uma concepção sobre o que presenciamos: uma crítica que resulta da natureza do Ser.
Esta opinião, resulta, muitas vezes, de preconceitos sociais aos quais o Homem se vê ligado; por isso, a convicção que defende torna-se uma mera crítica subjectiva sem fundamento (e assim falaciosa), ou acabamos por desconhecer as bases da nosso parecer, pois este apenas nos foi incutido por aqueles que nos rodeiam. Desta forma, caímos numa dormência mental, tornando-nos robôs idênticos, com ideias e preconcebidas incutidos por outrem.
No entanto, através da filosofia conseguimos desenvolver formas de pensar e criticar construtivamente o que nos rodeia. Assim, também nos é possível avaliar os problemas em discussão e, eliminando crenças, desenvolver uma opinião defendida através de argumentos válidos que lhe servem de suporte.
O autor do texto refere que “aquele que apenas conhece o seu lado da questão sabe pouco acerca do seu lado”, esta frase remete-nos uma vez mais para a importância da filosofia, visto que apenas conhecendo o problema em discussão é que nos é possível criar uma opinião. Sem conhecer as convicções de outros não as podemos avaliar e, dessa forma, entender se são ou não válidas, e se os argumentos apresentados são sólidos ou meras falácias. Só assim nos é possível construir argumentos válidos, utilizando a retórica, responder às possíveis objecções levantadas à nossa tese, e refutar argumentos através de objecções encontradas através da análise cuidadosa do outro lado da questão.
Fechando os olhos a outras opiniões tornamo-nos descuidados e arrogantes… a evolução do pensamento conduz à alteração de ideias e opiniões, logo, necessariamente só evoluímos mentalmente discutindo, ampliando os fundamentos para a nossa opinião.
Assim sendo, se apenas conhecer o seu lado da questão nunca se conseguirá saber as fraquezas dessa mesma tese, tornando-se esta última sem sentido e, possivelmente, repleta de lacunas.
Afinal, a única certeza que podemos ter é que o nosso conhecimento é demasiado limitado para nos darmos ao luxo de ignorar uma possibilidade de o alargar através de opiniões e críticas de outros.
"Aquele que conhece apenas o seu lado da questão, sabe pouco acerca do seu lado."
A actividade filosófica baseia-se na actividade crítica: apenas é possível “fazer” filosofia quando se ultrapassa o cepticismo e se toma uma atitude crítica, quando se deixa de olhar e passa a ver. Esta última, por sua vez, pode-se traduzir como sendo a procura da verdade, qualquer que ela seja (mesmo que não exista uma verdade objectiva); para ser bem sucedida, a actividade crítica tem de envolver o levantamento de questões e, posteriormente, a procura de razões que justifiquem uma possível resposta. No caso dos problemas filosóficos há, geralmente, mais do que uma resposta (tese), mas parte muito do nosso espírito crítico a posição que tomamos, ou seja, a resposta que considerarmos melhor sustentada em razões para responder ao problema será aquela que devemos aceitar.
Criticar é, portanto, saber refutar posições contrárias, levantar problemas, sair da Caverna. Para uma pessoa que defenda uma determinada tese não faz sentido não refutar as teses contrárias; mas essa mesma refutação de ideias também só faz sentido quando se conhece a posição contrária - o outro lado da questão. Desta troca de ideais surge o diálogo, sendo que este é, por si só, a base do desenvolvimento de toda a actividade crítica e, por conseguinte, da Filosofia (tomemos o exemplo de Platão, através das suas obras dispostas em diálogos, ou de Sócrates, que fazia do debate o seu maior acervo de informação e partilha desta). Do diálogo surgem as críticas à nossa própria posição, o que nos permite tomar consciência sobre o que está incorrecto ou mal esclarecido na nossa argumentação (tal como apenas nos conhecemos a nós mesmos quando nos dispomos a aceitar o ponto de vista dos outros sobre a nossa pessoa [somos demasiado pretensiosos para conseguirmos assumir certos defeitos]).
Por outro lado, falar sem conhecimento de causa leva-nos a cair na retórica. Alguém que não possua argumentos racionais, cogentes, acerca da sua posição apenas tem uma forma de conseguir que a sua tese seja aceite: manipulando. Somente um bom retor consegue tal proeza, pois a sua finalidade é convencer de tal modo o púlpito que este não levantará questões, e o debate terminará; finda a troca de críticas, o processo que referi no parágrafo anterior não se realizará: o ciclo de descoberta é cortado, como se fosse implementada uma espécie de "ditadura intelectual"; uma parte da nossa posição mantém-se incógnita (aquela que provavelmente descortinaríamos após uma análise cuidada dos nossos argumentos – o melhor ataque passa muito pela defesa).
Por alguma razão ao longo do estudo dos diversos problemas filosóficos o professor apresenta ao aluno as posições mais importantes de uma forma mais ou menos pormenorizada (que inclui os argumentos tanto a favor como contra); só depois de o aluno estar minimamente ciente de todos os aspectos relativos ao problema é que pode ajuizar de uma forma clara a sua própria posição; deste modo, a disciplina de Filosofia é a prova viva de que só quem conhece o outro lado da questão pode saber bastante acerca do seu próprio lado.
É importante para o desenvolvimento da mentalidade, tanto a nível pessoal, como a nível social, questionar e discutir.
Quando discutimos algo, temos de tomar uma posição, um partido, e apresentá-lo de modo a que os outros se apercebam da posição que tomamos.
Na verdade, algumas das nossas posições são influenciadas pela sociedade, como, por exemplo, quando a Bíblia era inquestionável, todos apoiavam as suas teses, com base na "Lei de Deus", mas assim não estaríamos a expor a nossa "verdadeira" opinião.
No entanto, temos de conhecer bastante bem a nossa posição, para podermos responder às objecções que poder-se-ão apresentar.
Assim, não só devemos conhecer bem a nossa posição, como também as posições dos outros, mas para além disso não devemos esquecer que os outros também têm liberdade de escolher a sua posição, e não o podemos julgar por isso, podemos sim, tentar persuadi-lo de uma forma racional a tomar a mesma posição que nós.
Bem vindos Liane e Fábio e agradeço, tal como à Ana Luísa, terem correspondido ao desafio que vos lancei! :)
Liane, dizes que:
«a única certeza que podemos ter é que o nosso conhecimento é demasiado limitado para nos darmos ao luxo de ignorar uma possibilidade de o alargar através de opiniões e críticas de outros.»
Bela forma de concluir o teu comentário, pois o autor ao defender a liberdade de expressão ou de opinião avança um argumento irrefutável, segundo o qual é um erro silenciar a opinião de alguém, precisamente pela oportunidade que essa opinião nos pode dar de progredir em direcção à verdade. Mesmo que a opinião traduza uma crença falsa!
O conhecimento sobre temas que dispensam os métodos empíricos de prova (tais como, a religão, a arte, a política, a moralidade, o sentido da vida, etc) exige uma pluralidade de opiniões, para termos a oportunidade de o alargar e de o construir. E com tudo isto evitamos o "descuido" e a "arrogância intelectual" como dizes e bem. Descuido porque ao ignorarmos uma opinião adversária, jamais podemos aperfeiçar a nossa (assumindo que somos mesmos seres falíveis); arrogância intelectual na medida em que evitar o debate livre e racional de opiniões, torna-nos mais falíveis e com menos oportunidade de saber o que quer que seja.
Fábio,
«não só devemos conhecer bem a nossa posição, como também as posições dos outros, mas para além disso não devemos esquecer que os outros também têm liberdade de escolher a sua posição, e não o podemos julgar por isso, podemos sim, tentar persuadi-lo de uma forma racional a tomar a mesma posição que nós»
Focaste a importância da argumentação e da retórica. Estas exigem a liberdade de expressão para que cada um se sinta capaz de assumir uma posição sobre algo. Mas referiste a importância do debate racional com vista à persuasão. Usar a retorica com vista à persuasão racional é uma via à qual não podemos escapar se estamos perante assuntos que são por natureza disputáveis. No entanto, usar a retórica com vista à manipulação é um erro, na medida em que se silencia a liberdade de expressão e de pensamento do adversário.
Parece-me a mim que:
Num universo de intelecto, aquando de uma busca sensata da verdade pelo uso prudente da razão, perante quaisquer conteúdos que possam ser discutidos, isto é, todas as matérias diferentes daquelas que admitem uma ideia circunscrita, nas quais existe um encadeamento de argumentos ou juízos que nos conduzem a uma só demonstração (uma verdade somente), é sempre possível haver discrepantes opiniões. Com o intuito de persuadir racionalmente outrem, apresentando-lhe razões para aderir a uma determinada ideia, cada lado de uma dada questão controversa é conhecido através da argumentação, tendo em conta a falibilidade humana, pelo que o confronto entre diferentes lados de uma determinada questão problemática consiste na submissão das diversas percepções à discussão. E é na discussão que as várias opiniões acerca de um assunto incerto, não só explanam os seus argumentos, como são confrontadas com contra-argumentos que requerem nova argumentação que os consiga refutar judiciosamente: só comprovando que nenhuma outra ideia, que não a nossa, pode ser sustentada e desembuçando as razões pelas quais só esta percepção merece uma adopção é que se atinge o equilíbrio entre os diferentes entendimentos da questão em que altercam, chegando, deste modo, à verdade. Porém, até à certeza, nós não entendemos os fundamentos da nossa opinião, ou, por outras palavras, desconhecemos os motivos pelos quais só determinada ideia deve ser admissível, e não as restantes. Desconhecemos, pois, os seus alicerces, já que ignoramos os fundamentos das restantes opiniões e, inclusive, não subjugamos a sua refutação, que é crucial para a noção dos nossos motivos.
Para se ser bem sucedido no acto de eloquência, de modo que o seu discurso tenha um efeito racionalmente persuasivo, e não seja, ao inverso deste, manipulador (através da argumentação falaciosa), ou, para que, este mesmo discurso, não leve a uma suspensão de juízo ou a uma preferência pela tomada imprudente de posição relativamente à questão controversa proposta, deixando acarretar a decisão pela autoridade ou por propensões, há que conhecer a fundo os restantes lados da questão em causa; há que ter noção dos seus argumentos e saber refutá-los. Só desta maneira conheceremos certamente o nosso lado da questão e saberemos se, dependentemente da in/existência de refutações (a que se possa, ou não, retribuir), é preferível reconhece-lo.
Em suma, no que respeita a questões disputáveis, o nosso parecer só é sabido a fundo quando todo e qualquer lado adverso a este parecer é, por nós, considerado e ajuizadamente conhecido. A verdade cresce, assim, no seio de uma opinião conhecida a partir da sua apreciação e daquelas que se lhe opõem, bem como as objecções às suas refutações, pois, só deste modo, não nos opomos a esse saber.
O pequeno exerto de Mill fala basicamente sobre o poder da discusão.
Discutir é muito importante. Quando se discute sobre uma certa questão está-se a procurar provar o melhor para essa questão, tal como na busca de novas tecnologias, onde se faz-se um melhoramento de um projecto para que este fique o melhor possivel.
Na Filosofia é igual, quando se discute procura-se a prefeição, procura-se uma argumento impossivel de ser refutado. Mas nem sempre é assim, so conseguimos compreender verdadeiramente os fundamentos da nossa opinião(argumento) quando esta é refutada, e so ai podemos perceber bem o que defendemos e em que nos basiamos.
"Aquele que conhece apenas o seu lado da questão, sabe pouco acerca do seu lado", alguém que so conheça o seu lado da questão não conseguira ser tão convicente como quem saiba ambos os lados, pois será muito dificel para alguem conseguir defender o seu lado quando não sabe como faze-lo e o que refutar.
A falta de conhecimento do outro lado da questão vai certamente prejudicar o argumento principal, provocando assim falhas na sua composição invalidando desde logo o argumento.
Tal como Stuart Mill fundamenta a verdade depende de um equilíbrio entre duas opiniões distintas. Para alcançar esse equilíbrio tem que se mostrar porque não pode outra teoria ser verdadeira. Assim cada tese, ensaio ou argumento tem como objectivo, em termos de discussão de ética, politica ou religião, refutar e dissipar as opiniões contrárias. Tornando o nosso ensaio, tese ou argumento mais convincente.
Sendo assim, quem não refuta a opinião contrária também não tem qualquer alicerce para fundamentar a seus próprios argumentos. É necessário então, saber justificar o que queremos defender, mas também é importante avaliar, criticar e refutar, se for caso disso, os argumentos, teses e teorias contrárias. Assim, teremos a desenvolver o nosso espírito crítico essencial à democracia. Portanto não iremos ter uma atitude dogmática, ou seja, iremos avaliar cuidadosa e imparcialmente as ideias e iremos declarar a sua falsidade ou verdade com razões para isso.
O mais importante de tudo é saber pensar, avaliar e argumentar por nós próprios tendo em conta as posições contrárias e questionar sobre essas mesmas posições - Liberdade de expressão. Deste modo, será promovida uma discussão originada pelas objecções de uma opinião, assim teremos a promover um pensamento continuo onde há oportunidade de discutir, refutar e mostrar qual a opinião mais aceitável.
Assim, é tão importante conhecer a sua própria opinião e sabe-la defender e fundamentar como também é essencial conhecer e antecipar as opiniões, teses ou teorias contrárias.
Bem vindas Catarina P., Catarina S. e Tiago! As vossas contribuições foram importantes e revelaram compreensão do texto.
Catarina Pereira, o teu comentário está muito bem redigido e apresenta claramente e de um modo desembuçado as ideias presentes no texto d MIll, ultrapassando-as até. Apreciei a frase:
«Num universo de intelecto, aquando de uma busca sensata da verdade pelo uso prudente da razão, perante quaisquer conteúdos que possam ser discutidos, isto é, todas as matérias diferentes daquelas que admitem uma ideia circunscrita, nas quais existe um encadeamento de argumentos ou juízos que nos conduzem a uma só demonstração (uma verdade somente), é sempre possível haver discrepantes opiniões.»
Os vossos comentários explicitam correctamente o significado da frase em relevo.
Contudo, no final do texto autor refere que caso não se tente conhecer a posição adversária ou suspendemos o juízo (isto significa que evitamos pronunciar-nos sobre o tema em discussão) ou submetemo-nos à autoridade. De facto, quando desconhecemos verdadeiramente uma posição contrária jamais pode haver discussão racional e a subsequente procura da verdade. Assim, remetemo-nos para a ignorância ou para a repetição de ideias proferidas por alguém, tomando-as como verdadeiras (recurso a argumentos de autoridade).
Bom resto de fim de semana!
Filosofar ou “fazer filosofia” ajuda-nos a encontrar uma forma de convencer os outros e também nós próprios da veracidade e moralidade da tese que pretendemos defender. Para isso ser possível é preciso conhecer tanto o nosso lado, como os de outros, mesmo que as opiniões sejam tão divergentes que seja impossível uma existir em comunhão com a outra. Aquando de uma busca persistente e racional pela opinião mais persuasiva, é necessário a discussão de todas as teses apresentadas, pois aquela que se nega à discussão em nada melhora a sua persuasão, provocando nos outros apenas uma desconfiança relativamente a lacunas demasiado acentuadas nessa tese em questão. Aquele que, com sensatez, discute com raciocínio lógico, bem fundamentado, através de argumentos convincentes e sólidos, demonstra assim que conhece a falibilidade do ser humano e tenta combatê-la através da persuasão racional, colocando em confronto directo as ideias que pretende defender. É através dessa discussão e da forma como esta se desenrola que se determina qual a posição mais acertada. Apenas conseguirá um suado triunfo aquela que explana os seus argumentos, defendendo-se de críticas mostrando que estas são apenas meras lacunas facilmente refutadas. Comprovando que nenhuma ideia ou tese é sustentada tão dignamente como aquela que é alvo da nossa adopção, atingimos assim um nível de persuasão a que nenhuma pessoa, filosoficamente entendida, deixa passar ao lado. Oferecermo-nos para uma discussão racional demonstra que por muito que confiemos naquilo que nos distingue dos restantes animais, o pensamento, é real mas falível.
Por outro lado, reconhecer a tese em questão como verdadeira e inquestionável, leva-nos a cair numa manipulação, de onde é impossível retirar quaisquer conclusões fundamentadas. Se ao defendermos algo, o tomamos imediatamente como o certo, mostramos a arrogância do ser humano. Quem opta por não oferecer a sua tese para discussão, para assim conhecer as lacunas e falhas que esta apresenta, estagna assim a sua capacidade filosófica, deixando que a não evolução do seu pensamento o impeça de melhorar a sua própria opinião.
Através das discussões filosóficas, e não só, é-nos possível alargar visões e ver mais além, conhecendo outra ideias, por vezes bem melhor fundamentadas que aquela que anteriormente estávamos inclinados. Só assim nos é possível construir ideias filosoficamente aceitáveis, nem que seja apenas por uma questão de tempo, isto é, aquando do confronto directo com outra tese distinta, em que a batalha é ganha por aquela que melhor justificar a sua opinião.
Num mundo onde guerras e confrontos económicos imperam, é urgente recorrer à retórica, conhecer as facilidades que a filosofia nos dá, e tornando-nos mais humanos. Se somos dotados de racionalidade, utilizá-la em proveito de todos é, a meu ver, o mais correcto a fazer, oferecendo-lhes teses e ideias bem fundamentadas por argumentos cogentes e sólidos. “É a falar que a gente se entende” – a sabedoria popular nunca nos engana.
A conformação por parte das pessoas já é algo que subsiste há muito tempo, desde que os seres humanos desenvolveram as suas faculdades mentais. No início, quando alguém decidia impor as suas ideias ou leis, isso era inquestionável, ninguém se atrevia a pensar pela sua própria cabeça, isto também pelo facto de não existir a liberdade de expressão, daí que o medo das consequências oprimisse o pensamento. Contudo, a liberdade de expressão é um direito conquistado, apesar de o não parecer, uma vez que a discussão de ideias e o pensamento ainda é algo muito controlado por parte de quem tem mais influencia, parece que cada vez mais estamos a perder a liberdade e que as pessoas se deixam levar apenas pelo que os outros dizem, são incapazes de se impor, e a culpa é destas mesmas pessoas que não discutem, e como sabemos só através da crítica e da discussão é possível evoluir e obter conhecimento. Tal como refere Stuart Mill “ não percebemos fundamentos da nossa opinião.” Se formos questionar as pessoas sobre um determinado assunto, estas sabem defender uma opinião, mas se lhes perguntarmos o porque de terem essa convicção, o porquê a defendem, então já iram ser poucas as pessoas que saberão responder, pois muitos ideais não passam de meras crenças infundamentadas ou que nunca foram postas em causa.
O autor refere ainda que “aquele que apenas conhece o seu lado da questão sabe pouco acerca do seu lado”, isto porque alguém que se limita a aceitar o que se diz, e não procura razões para tal, não pode criticar e por sua vez não tem opinião própria, não é capaz de refutar algo, por mais que o defensor da opinião contrária esteja totalmente errado. Assim sendo, a filosofia é uma ciência que procura explicar aos alunos a importância da discussão, para que estes não se tornem cidadãos ignorantes, mas sim seres com autónomos e com capacidade crítica e por fim à conformação.
Para podermos conhecer e defender correctamente a nossa opinião, a tese que vamos defender, não nos basta por si só saber apresentar argumentos razoáveis e capazes de persuadir racionalmente o auditório de que o que defendemos é o mais plausível e aceitável.
Para defendermos uma posição temos não só de conhecer o nosso lado da questão mas também o lado do outro, ou seja, podemos apresentar argumentos sólidos e bons e através destes conseguir definir uma posição coerente que se “suporte” nestes argumentos, contudo se refutarem estes últimos temos de ter inteligência, perspicácia e conhecimento necessário para nos defendermos de modo a que os nossos argumentos, apesar de sólidos não sejam deitados por terra. Refutar e ser refutado (e refiro-me aos argumentos e não ao orador) é a base da discussão, se não houvesse refutação não haveria discussão mas sim uma opinião única, que seria tida como verdadeira.
É nossa obrigação, como seres dotados de inteligência e curiosidade, procurar conhecer teses e teorias diferentes à nossa, pois se não o fizermos não vamos ter a capacidade de discutir um determinado assunto racional e logicamente. Se não prevermos o que o outro vai dizer para o conseguir “combater”, vamos evitar discutir e, evitar discutir vai consequentemente “extinguir” a verdade, pois vamos impossibilitar o confronto de ideias podendo silenciar assim o que possui a verdade e deixar ignorante aquele que não o quer ser.
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