17.11.11

"Libertas Philosophica"

Nascido em Itália, no ano de 1548, Giordano Bruno foi mais do que um mártir da falta de liberdade de expressão imposta por um tempo em que os pensadores e cientistas não poderiam ir além do princípio de autoridade. Ainda que os ideais do Renascimento já vigorassem na Europa, aqueles que pretendessem encontrar a verdade teriam de se restringir à Revelação divina e à física aristotélica. Porém, houve outros que ao longo da História não permitiram que o seu espírito se subtraísse às verdades impostas e, em consequência disso, sacrificaram a sua vida por uma ideia que despontava da experiência da liberdade de pensar, sonhar e filosofar.
Os seus cinquenta e dois anos de vida dão conta de um percurso atípico do intelectual renascentista: defensor dos princípios humanistas, frequentador das cortes europeias, orador em várias universidades, protegido de reis, correligionário de protestantes e de católicos, excomungado por católicos e protestantes. A sua ligação à religião preludia a que será de Espinosa, quase cem anos depois; as suas descobertas científicas são mais arrojadas que as de Galileu Galilei ou Tycho Brahé, defendendo-as de um modo tão feroz quanto foi o seu destino.
Dotado de uma capacidade extraordinária para usar o dom que os gregos chamavam de mãe das Musas, a Memória, foi requisitado por reis e nobres. Em 1590, cansado de vaguear pelas universidades europeias e de ensinar a teoria heliocêntrica, que na época mais ninguém se arriscava a propalar, aceitou o convite do nobre veneziano Giovanni Mocenigo para regressar a Itália, com a condição de o iniciar na arte da mnemotécnica (ou seja, a arte de desenvolver a memória). Porém, temendo que a avareza do seu aluno empregasse os seus ensinamentos nas más obras, recusou-se a fazê-lo. Por vingança, o seu discípulo aprisionou-o num quarto e denunciou-o ao Santo Ofício. Apesar dos dez anos de prisão, tortura e apresentação de provas em sua defesa, jamais renunciará aos princípios que defendia, e será condenado à morte na fogueira, sob a acusação de heresia.
Se defendia que os mundos eram infinitos tal como o seu criador, que Deus não é transcendente, mas imanente às coisas, que a Revelação não serve de prova científica, ou se defendia o heliocentrismo e a existência de vida inteligente noutros planetas, o Tribunal do Santo Ofício foi mais astuto e condenou-o por magia e bruxaria. No entanto, o filósofo italiano não era um mago. Munido de um espírito insaciável, cruzou a ciência e a razão com o misticismo e a fé, não segundo os ditames da época, mas rememorando ideais perdidos no esquecimento da história: peregrinando solitariamente por uma trama de caminhos cruzados entre o neoplatonismo e o hermetismo (conjunto de ensinamentos oriundo do Antigo Egipto que prestavam fidelidade ao deus da escrita e da medicina, Toth). A sentença do Tribunal concretizou-se a 17 de Fevereiro de 1600, no Campo di Fiori, em Veneza.
De Giordano Bruno não restaram muitas obras, pois a maioria foi acrescentada ao Índex, mas o princípio que perseguiu durante toda a vida perpetuou-se - Libertas philosophica - o direito de pensar, sonhar e filosofar.

Passados 402 anos da morte de Giordano Bruno, a humanidade, representada pela Unesco, em prol da defesa da liberdade de expressão e do pensamento racional, pode pôr em ato a "libertas philosophica" tão propalada pelo filósofo italiano.

Professores Graça Silva e Valter Boita

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