13.6.09

Seremos moralmente responsáveis, de uma forma directa, pela preservação do ambiente?


O problema da responsabilidade moral para com o meio ambiente é um problema de ética aplicada, mais especificamente no ramo da ética ambiental. Envolve várias questões tais como: “Teremos alguma obrigação moral de preservar o meio ambiente?”, o tema central desta dissertação; “Haverá algo de errado com a extinção das espécies?” ou “Será moralmente aceitável impedir o desenvolvimento industrial dos países pobres de forma a evitar o aumento da poluição?”. Estas questões são importantes, uma vez que a sobrevivência tanto de animais como de plantas é altamente dependente da manutenção da qualidade das condições ambientais.
Para debater problemas ambientais é necessário, primeiramente, reunir informação empírica para apurar os argumentos relevantes para o problema a tratar.
Analisemos o que nos diz Peter Singer:

(...)“Um rio serpenteia por entre ravinas cobertas de floresta e gargantas escarpadas em direcção ao mar. A comissão hidroeléctrica estatal considera as quedas de água energia não aproveitada. A construção de uma barragem numa das gargantas proporcionaria trabalho durante três anos a 1000 pessoas e emprego a longo prazo para 20 ou 30. A albufeira armazenaria água suficiente para garantir que o estado satisfaria de forma económica as suas necessidades energéticas da década seguinte. Esta situação fomentaria o estabelecimento de indústrias de energia intensiva, contribuindo assim ainda mais para o emprego e crescimento económico.
O terreno acidentado do vale do rio só permite o acesso a pessoas de razoável condição física, mas é, apesar de tudo, um lugar predilecto dos que gostam de passear pelo bosque. O próprio rio atrai os mais ousados praticantes de desportos radicais, como o rafting. No coração dos vales abrigados encontram-se manchas de uma espécie rara de pinheiros, tendo muitas das árvores uma idade superior a 1000 anos. Os vales e desfiladeiros abrigam muitos animais e aves, incluindo uma espécie em perigo de rato marsupial, que raramente se vê fora do vale. Pode haver muitos outros animais e plantas raros, mas ninguém sabe ao certo porque os cientistas ainda não estudaram esta região a fundo.
Será que se deve construir a barragem
?” (...) (Ética Prática, 1993)

Para responder à questão levantada por Singer, podemos adoptar vários argumentos distintos. Os apologistas da ética antropocêntrica defendem que apenas os seres humanos têm valor intrínseco, ou seja, só a nossa espécie merece ser considerada de um ponto de vista ético e moral nas decisões a tomar acerca das políticas ambientais. Assim, só as decisões que lhes são convenientes e lhes proporcionam mais-valias devem ser tidas em conta. Alguém que defenda esta perspectiva ética seria da opinião de que a barragem deveria ser construída, uma vez que as vantagens para o ser humano seriam bastante superiores às desvantagens. Qualquer tipo de consequências negativas para os seres vivos não-humanos, seriam ignoradas, pois estes não têm, aos olhos dos antropocentristas, estatuto moral. No entanto, esta posição é bastante discutível mesmo no seio desta perspectiva ética, pois se pensarmos nas gerações futuras, veremos que estas serão mais relevantes em termos de número do que aquelas que irão usufruir dos ganhos imediatos desta construção. Assim, segundo esta perspectiva, a construção da barragem seria inaceitável.
Contudo, este ponto de vista da ética ambiental deixa-nos uma questão: por que razão serão os seres humanos os únicos a ter valor intrínseco? Para alguns filósofos, o nosso valor intrínseco advém de capacidades como o poder de escolha racional e o uso coerente da linguagem. Mas, desta forma, estaríamos a excluir alguns seres humanos desprovidos de tais aptidões, como é o caso dos bebés e dos portadores de insuficiências mentais. Jeremy Bentham, filósofo crítico da ética antropocêntrica, propôs que um ser tem valor intrínseco quando possui a capacidade de sentir dor, isto é, quando é um ser senciente. Deste modo todos os seres tanto racionais como irracionais teriam valor intrínseco.
Esta perspectiva é conhecida como ética da vida senciente. Apesar de estabelecer que todos os animais sencientes devem ser considerados moralmente, estes podem ser hierarquizados. Citando novamente Peter Singer, “Podemos (…) encarar a morte de um animal não humano (…) como menos significativa do que a morte de uma pessoa, dado que os seres humanos são capazes de prever e planear o futuro de uma forma que não está ao alcance dos animais não humanos.(Ética Prática, 1993).
Para analisarmos o problema da construção da barragem tendo em conta as ideias desta teoria, seria necessário abranger não só os interesses das gerações presentes e futuras da espécie humana, mas também os de todos os seres sencientes. Podemos então aferir que os terrenos circundantes do local para o qual a barragem está projectada apresentarão maiores benefícios e terão um maior valor, tanto para as gerações actuais como vindouras não só dos seres humanos, mas também de todos os seres sencientes, se esta obra não for efectuada. Assim, será eticamente aceitável sobrevalorizar os seres sencientes, em detrimento dos seres não sencientes, como as árvores?
Quem defende a ética da vida, segundo a qual todos os seres vivos têm valor intrínseco, embora com estatuto moral diferente (tal como o filósofo americano Paul Taylor), afirma que o que concede significado moral a um organismo não é só a capacidade de sentir dor nem o facto de ser consciente, mas sim o de ter uma finalidade.
Assim sendo, aplicando a ética da vida ao problema anterior, teremos de considerar não só os interesses dos seres sencientes, mas de todos os seres vivos hipoteticamente afectados pela construção da barragem.
Posto isto, consideramos a construção da barragem inexequível, já que a ética da vida reforça também a tese defendida pelos éticos da vida senciente, pois engloba os interesses não só de uma fracção de seres vivos, mas da totalidade das populações da área envolvente. Embora os argumentos da ética da vida senciente e da ética da vida convirjam na solução do problema levantado, noutros casos poderão dar azo a posições divergentes.
Pelo que ficou exposto, consideramos que, embora radical em algumas situações, a ética da vida, se moderada, é a que nos parece mais adequada.
Referências Bibliográficas:
ALMEIDA, A. et all; A Arte de Pensar; Filosofia 11º Ano; 2ª Edição; Didáctica Editora; 2008; pp. 231-242
SINGER, P.; Ética Prática; 2ª Edição; Gradiva; 2002; pp. 287-301
Imagem retirada do Google sem referência ao autor
David Vicente, Miguel Lopes e Tatiana Ladeira
11. C

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