21.2.10

O valor de uma acção depende do número de pessoas que a pratica? (Conclusão)

" (…) É frequente associar "Toda a gente faz o mesmo" à ideia de que é impossível mudar o que quer que seja. A forma mais comum que este argumento assume é a seguinte: "Sempre foi, é e será assim!" O que se pretende dizer com isto, naturalmente, é que como algo sempre ocorreu de dada maneira no passado continuará a ocorrer dessa maneira daqui em diante, façam as pessoas o que fizerem. Este argumento indutivo deve ser persuasivo, uma vez que é tão frequentemente evocado. No entanto, a sua conclusão é falsa.
Se "Sempre foi, é e será assim!" fosse verdadeiro, o Boavista nunca teria ganho o campeonato. Este é um exemplo simples que mostra inequivocamente a falsidade da conclusão do "argumento imobilista". Ele mostra claramente que pelo facto de algo ter sido sempre de determinada maneira no passado, não se segue que continuará a ser no futuro. (…)
Há, no entanto, uma formulação desta ideia que requer mais atenção. Trata-se de quando se afirma, ou porque as coisas sempre serão como foram ou porque a tarefa é titânica, que o efeito da nossa acção individual é tão insignificante que não merece a pena fazer seja o que for. Este argumento tem constituído injustificadamente um dos maiores apelos à imobilidade. Contudo, muitas mudanças resultaram de iniciativas individuais ou de um pequeno número de pessoas, que ganharam aceitação geral. (…) Historicamente, o exemplo mais notável e mais importante é o de Jesus Cristo. Mas Cristo não é o único exemplo. A galeria é extensa: Sócrates, Buda, Alexandre, o Grande, Colombo, Infante D. Henrique, Copérnico, Descartes, Newton, Napoleão, Hitler, Darwin, Marx, os Wright, Einstein, Peter Singer e muitos mais. Note-se que muitos, talvez até a maior parte, eram simples indivíduos que não exerceram cargos de poder. (…)
Ao contrário do que o imobilista julga, a análise que fizemos do seu argumento revela que, mesmo em domínios em que as mudanças são lentas, elas têm existido. A maior parte dessas mudanças têm sido no sentido de tornar as sociedades humanas um pouco melhores. Infelizmente, essas conquistas não são irreversíveis e as mudanças também podem ser em sentido inverso, como o mostram a forma como as mulheres foram tratadas no Afeganistão durante o governo dos talibã ou as intenções recentes de reintroduzir a tortura como instrumento policial de investigação nos Estados Unidos.
Outra coisa que a análise parece deixar clara é que, para que a mudança exista, é preciso que nos esforcemos e empenhemos todos. Só com o nosso esforço contínuo e a luta por um pouco mais de justiça, podemos construir um mundo um pouco mais justo. Para esse fim, todas as vozes são precisas e a nossa pequena voz, ao contrário do que o imobilista pensa, é essencial. Ela é como uma gota que, sozinha é insignificante, mas que com as outras forma um oceano. E é preciso um oceano para tornar, progressivamente, o mundo um pouco melhor. "
Álvaro Nunes, "Toda a gente faz o mesmo", Parte II,
(texto adaptado)
Imagem: Google imagens

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