14.6.10

Teremos a obrigação ética de ajudar quem vive na pobreza absoluta?

Entende-se por pobreza absoluta a ausência de rendimento suficiente em dinheiro ou em espécie para satisfazer as necessidades mais básicas de alimentação, vestuário e habitação. Além de ser a principal causa de sofrimento humano está na origem de muitas mortes prematuras, que podiam ser evitadas. Teremos alguma responsabilidade moral indirecta por estas mortes? Teremos a obrigação ética de ajudar quem vive na pobreza extrema? Devemos impedir alguma pobreza se pudermos fazê-lo?
A posição que defendemos é que temos a obrigação ética de ajudar os mais pobres, se pudermos evitar alguma pobreza, devemos fazê-lo. Esta posição foi anteriormente defendida por Peter Singer no seu livro Ética Prática. O argumento é o seguinte:
1. Se pudermos impedir que um mal aconteça sem sacrificarmos nada de importância moral comparável, devemos fazê-lo.
2. A pobreza absoluta é um mal.
3. Há pobreza absoluta que podemos evitar sem sacrificar nada de importância moral comparável.
4. Logo, temos a obrigação de ajudar os mais necessitados impedindo assim alguma pobreza absoluta.
Mas, se decidirmos não ajudar, não devemos ser julgados por isso, já que ajudar é um acto supererrogatório (um acto bom e desejável mas não obrigatório). Visto que os nossos bens resultaram do nosso esforço e do nosso trabalho, ao partilhá-los, estaremos a abdicar de algo legítimamente conquistado e que futuramente nos poderá fazer falta. Por isso a ajuda deve ter limites.
Contrariamente à nossa posição há quem pense que não devemos ajudar, pois essa ajuda pode ter consequências negativas. Garrett Hardin, um defensor desta ideia, diz-nos que se ajudarmos, isso poderá levar os governos desses países à desresponsabilização, dependendo cada vez mais das organizações de solidariedade e até ao aumento desenfreado da população o que causará ainda mais pobreza. Mas este argumento é superficial e não tem em conta as necessidades reais das pessoas. Se contribuirmos por exemplo, na educação, na luta contra a mortalidade infantil ou na criação de melhores infra-estruturas que ajudem as pessoas a tornar-se independentes a médio prazo, então os factos mostram que a população tem tendência a estabilizar e a tornar-se progressivamente auto-suficiente dependendo cada vez menos de ajudas exteriores.
Outra objecção à posição que defendemos é a ameaça à integridade pessoal e a violação do direito de propriedade daqueles que ajudam. Segundo este argumento, ajudar poderia colocar-nos a nós na situação de pobreza ameaçando a nossa integridade, visto termos de abdicar de grande parte dos projectos que nos fazem felizes. Mas este argumento não é forte pois pressupõe um tipo ilimitado de ajuda e não é isso que está em causa. A ajuda deve ser limitada de modo a não sacrificarmos a nossa dignidade e integridade. Estes limites devem ser traçados por quem ajuda dado que esta é um acto supererrogatório.
Finalmente, algumas pessoas argumentam que a responsabilização pelos males evitáveis decorrentes da pobreza é inadmissível uma vez que, se não fomos nós que os causamos, não podemos ser responsabilizados por eles.
É verdade que não somos responsáveis, mas não é de responsabilidade em sentido estrito que se trata. O dever de ajudar é um dever que decorre do valor da solidariedade,(a) vai além da responsabilidade pelas nossas escolhas individuais. É um dever que decorre de sermos pessoas. Somos seres livres e responsáveis pelas nossas acções e somos também pessoas. Se podemos evitar alguma pobreza, devemos fazê-lo.
Imagem encontrada no Google sem referência ao autor
Daniela Luís, Luís Silva e Sofia Santos
10.º D
(a) A este propósito veja-se os conceitos de reciprocidade/vulnerabilidade no artigo de Faustino Vaz, "A quem fazer o Bem?" na revista Crítica, publicado em data posterior a este texto.

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