Kazimir Malevich (1878-1935), Pressentimento Complexo
A
liberdade que temos ou não relativamente às nossas escolhas levanta fortes
dúvidas. Os conhecimentos que temos da Natureza levam-nos a acreditar que
vivemos num Universo determinista, em que tudo está determinado, quer pelas
Leis da Natureza, quer por acontecimentos anteriores. Mas surgem factos e
teorias que nos levam a acreditar que a questão não é assim tão simples e
clara. É assim que surge o problema do livre-arbítrio: seremos nós seres livres
com total responsabilidade para escolher o que julgamos ser melhor para nós? Este
é o problema metafísico de saber se temos ou não livre-arbítrio. Ao longo da
História, este assunto foi abordado a par da noção de pecado, no entanto, este
problema mantém-se atual: os conhecimentos que vamos adquirindo nas ciências
levam-nos a questionarmo-nos quanto à origem das nossas ações.
Todos os acontecimentos são
condicionados por diversos fatores que os influenciam, sejam eles de ordem
sociocultural, psicológica ou fisiológica. No entanto, isto não é suficiente para
nos levar a aceitar o Determinismo radical, posição segundo a qual não há
livre-arbítrio e tudo está determinado. É imperativo não confundir determinismo
com fatalismo. Enquanto o determinismo defende que se tomarmos determinada
atitude as consequências desta não são possíveis de alterar, o fatalismo
defende que mesmo mudando as cadeias causais nada do que possamos fazer terá
efeito nas atitudes que iremos tomar. O argumento que sustenta o determinismo
radical tem como primeira premissa: ‘se o determinismo é verdadeiro, não há
livre-arbítrio.’ A segunda premissa afirma o determinismo como verdadeiro, pelo
que conclui que o livre-arbítrio é uma ilusão. Este argumento mostra-nos que o
livre-arbítrio só seria possível se pudéssemos agir de maneira diferente
perante as mesmas condições e a mesma cadeia causal, ou seja, pudéssemos
escolher não concretizar alguma situação quando todos os acontecimentos
propiciassem a que tal acontecesse. Não é plausível que tal possa acontecer,
pois no nosso quotidiano pressupomos que perante determinada causa surja
determinado efeito, as Ciências Naturais comprovam isso mesmo. O determinista
pode concluir que o livre-arbítrio é uma ilusão uma vez que todas as decisões
que sentimos tomar surgem de condições que não pudemos controlar.
No entanto, a responsabilidade moral
pode ser um impedimento à aceitação desta posição determinista, pois se tudo
estivesse à partida determinado não haveria legitimidade para condenar e
castigar quem efetuasse qualquer infração ou crime. Neste caso, se
considerássemos que os crimes estavam designados para acontecer teríamos de
considerar que também as condenações estavam determinadas, o que retira
utilidade às Forças de Segurança. Podemos no entanto defender que,
independentemente da responsabilidade moral que os criminosos tenham ou não,
terão de ser castigados, de modo a dar o exemplo e a evitar que outros cometam
o mesmo crime, dissuadindo-os e prevenindo situações futuras. No entanto, há
outro problema, quando agimos já estamos a manifestar a nossa vontade, ao
aceitarmos que não somos responsáveis pelas nossas atitudes perdemos o sentido
de viver e de participar ativa e criticamente na sociedade.
Ao contrário do Determinismo
radical, um Libertista defende que nem todos os acontecimentos estão
determinados e que temos liberdade para efetuar as nossas escolhas após um
período de ponderação e que essas escolhas serão da nossa responsabilidade,
pois podíamos ter escolhido outra opção. O argumento principal propõe que ‘se
há livre-arbítrio, o determinismo é falso.’ Afirma o livre arbítrio, o que nos
conduz à conclusão de que o determinismo é falso. Só temos livre-arbítrio se
pudermos tomar decisões sem que os acontecimentos passados interfiram com elas.
O argumento que defende que vivemos num Mundo determinista não invalida a
teoria apoiada pelos libertistas, uma vez que as ciências onde se verifica
sempre o par causa-efeito são naturais e não conseguem prever a psicologia
humana. Uma ação livre não pode ser apenas a continuação de uma enorme cadeia
causal, pois aí aceitaríamos o Determinismo radical, tem de desenvolver a sua
própria cadeia estando sobre o controlo do agente.
Mas também esta teoria tem problemas:
mesmo que as ações efetuadas não tenham sido baseadas em acontecimentos
anteriores tiveram alguma influência de desejos ou crenças do agente, pois caso
isso não acontecesse teriam sido aleatórias, e ambas as situações negam o
Libertismo. É objetivo dos libertistas encontrar então pelo menos um ato sem
influências de cadeias causais anteriores e que não tenha sido um acaso, mas
esse é o seu maior desafio.
Há uma terceira resposta, designada
Determinismo moderado. Esta compatibiliza o Mundo físico determinado pelas Leis
da Natureza com a oportunidade de arbitrarmos algumas situações da nossa vida. O
Determinismo moderado admite assim uma forma mais fraca de livre-arbítrio, com
a justificação de que, apesar das cadeias causais que coordenam as nossas
ações, é possível tomar ou não certas decisões, tornando-nos responsáveis por
elas. Esta teoria reformula, também, os conceitos de causa e de liberdade:
somos livres para escolher caso as nossas motivações não tenham sido originadas
por coações ou outro tipo de controlo de outrem sobre nós. Podemos justificar
esta posição do seguinte modo: ‘As nossas ações são livres se resultam do que
queremos.’ (premissa 1). A segunda premissa explicita o facto das causas
(crenças e desejos) não serem determinantes, mas serem sim, meras inclinações,
sendo assim possível concluir que podemos compatibilizar o determinismo
(causas) com o livre-arbítrio (escolhas livres).
Também esta resposta não está isenta
de problemas: podemos defender que constrangimentos e inclinações são o mesmo,
comparando a teoria compatibilista com o Determinismo radical, apenas apresentando
uma única diferença relevante: o apoiante do Determinismo radical aceita estar
a ser influenciado por coações ou acontecimentos anteriores, enquanto o Determinista
moderado recusa o conhecimento dessas situações e justifica que as suas crenças
e desejos não podem servir como justificação para coisa alguma. Há ainda outra
objeção, por exemplo, John Searle, mostra-nos que é impossível agir sem
pressupor o livre-arbítrio radical e até que, se recorrermos ao exemplo da
física e da química, tudo pode ser causalmente explicado. O filósofo pretende
expor a sua ideia de que esta forma de Determinismo ainda não assenta em
argumentos suficientemente plausíveis para resolver o conflito entre o
determinismo e o livre-arbítrio. Contudo, esta é a teoria que melhor soluciona
o problema do livre-arbítrio. É evidente que o passado influencia algumas
decisões que tomamos, pois caso isso não acontecesse todos os nossos atos
seriam isolados e não fariam sentido na complexidade dos nossos dias. No
entanto, considero que nenhuma das posições estudadas é totalmente
satisfatória.
Inês Couto 10.º D
Referência:
ALMEIDA, Aires;
TEIXEIRA, Célia; MURCHO, Desidério; MATEUS, Paula; GALVÃO, Pedro; A Arte de
Pensar, Filosofia 10º ano; Lisboa; 2010; Didáctica Editora
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