Neste trabalho, discute-se o problema filosófico da
moralidade da eutanásia, com foco na autonomia permitida. Esta questão
insere-se no âmbito de reflexão da ética prática. A posição que defendo é que a
prática da eutanásia voluntária é uma forma de respeitar a autonomia daquele
que pretende morrer.
Por eutanásia,
entende-se o ato de causar intencionalmente a morte de um indivíduo, tendo como
objetivo o benefício ou diminuição do prejuízo do mesmo. Quem procura a eutanásia
pretende pôr fim a uma vida de sofrimento, como a de um doente terminal ou de
um paciente irreversivelmente inconsciente. Para justificar a moralidade da
eutanásia, os defensores desta prática defendem que esta possibilita a
minimização do sofrimento do sujeito e que respeita a sua dignidade, autonomia
e racionalidade. Por outro lado, aqueles que pretendem defender a imoralidade
da eutanásia podem justificá-lo dizendo que esta viola a dignidade ou autonomia
da pessoa e ainda que a vida humana é valiosa independentemente da sua
qualidade.
O tipo de
eutanásia relevante nesta discussão é a eutanásia
voluntária, na qual a morte é provocada atendendo a uma vontade do paciente,
que deve ser exprimida pelo mesmo após aconselhamento profissional, de modo a
certificar-nos que esta é ponderada e informada.
Uma tese apresentada
por alguns opositores da eutanásia defende que, como a autonomia só existe quando a pessoa age moralmente, e como o
exercício da autonomia é contrário à eutanásia voluntária e ao suicídio
assistido, que estes são imorais. David Oderberg define autonomia como a capacidade de tomar decisões individuais à luz de
leis universais encontradas pela razão, seguindo a moralidade definida por Immanuel
Kant.
Mas será que
isto justificará a imoralidade da eutanásia? Oderberg fundamenta-o nos
seguintes termos:
1. Não podemos
desejar racionalmente que a máxima “Devo encurtar a minha vida se dela esperar
mais desgraças que alegrias” se transforme em lei da natureza;
2. Matar uma
pessoa para lhe aliviar o sofrimento é sempre tratá-la apenas como mero meio e
não como um fim.
Em relação primeiro argumento, creio que aceitaríamos –
embora Kant recusasse, certamente - a
universalização de uma formulação diferente da mesma máxima: ‘Devo respeitar a autonomia
da vontade daqueles que desejem encurtar a sua vida, quando apenas podem
esperar dela sofrimento, no presente e no futuro.’
Em relação ao segundo argumento, Oderberg diz-nos que
tratamos uma pessoa como meio e não como fim quando lhe terminamos a vida para
aliviar o seu sofrimento. Não concordo com este argumento pois ao terminar a
vida da pessoa em sofrimento, temos em mente o bem-estar da mesma, sendo este o
verdadeiro fim da nossa ação. Sendo assim, tomamos como meio a ação de matar,
com a finalidade de restaurar o bem-estar à pessoa, ou o fim do sofrimento, em
casos que este seja apenas possível após a morte da mesma.
Oderberg conclui
ainda que, se praticar a eutanásia é um ato imoral, realizá-lo é contrário à
autonomia da pessoa. E que, se queremos respeitar a sua autonomia, devemos
condenar qualquer forma de morte a pedido, em vez de anuir cegamente a
quaisquer solicitações que nos possam fazer.
Ora, eu proponho uma refutação a este argumento, considerando
que a conclusão a que Oderberg chegou é contraditória com o princípio antes
estabelecido. Senão, vejamos: ele define
autonomia como capacidade de tomar decisões individuais à luz de leis
universais encontradas pela razão e defende que respeita a autonomia de um sujeito ao condenar o pedido ponderado e
informado do mesmo. Ora,
parece-me que não respeitar uma decisão racional e ponderada, de um dado
sujeito, significa não respeitar a sua autonomia.
Considero que a prática da eutanásia voluntária permite
respeitar a autonomia, isto é, a capacidade de alguém tomar decisões, por si e
para si mesmo, de alguém num estado de saúde crítico, não sendo este, no
entanto, condicionante da sua autonomia.
Ao atender ao pedido repetido de alguém que, ainda que
racional, não pode agir tendo em conta o seu estado de saúde, estamos a
respeitar a pouca autonomia que esta pessoa ainda detém.
Em suma, o tipo
de eutanásia que defendo é a eutanásia voluntária, na qual a morte é provocada
atendendo a uma vontade do paciente, que deve ser exprimida pelo mesmo, após
aconselhamento profissional, de modo a certificar-nos que esta é racional, ponderada
e informada, devendo, portanto, esta sua última vontade deve ser respeitada. Assim
sendo, considero que não há qualquer razão na tese proposta por Oderberg, que
justifique a imoralidade desta prática.
Margarida Sardinha, 10ºB
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