27.6.20

A eutanásia: A autonomia do sujeito

Neste trabalho, discute-se o problema filosófico da moralidade da eutanásia, com foco na autonomia permitida. Esta questão insere-se no âmbito de reflexão da ética prática. A posição que defendo é que a prática da eutanásia voluntária é uma forma de respeitar a autonomia daquele que pretende morrer.


Por eutanásia, entende-se o ato de causar intencionalmente a morte de um indivíduo, tendo como objetivo o benefício ou diminuição do prejuízo do mesmo. Quem procura a eutanásia pretende pôr fim a uma vida de sofrimento, como a de um doente terminal ou de um paciente irreversivelmente inconsciente. Para justificar a moralidade da eutanásia, os defensores desta prática defendem que esta possibilita a minimização do sofrimento do sujeito e que respeita a sua dignidade, autonomia e racionalidade. Por outro lado, aqueles que pretendem defender a imoralidade da eutanásia podem justificá-lo dizendo que esta viola a dignidade ou autonomia da pessoa e ainda que a vida humana é valiosa independentemente da sua qualidade.
O tipo de eutanásia relevante nesta discussão é a eutanásia voluntária, na qual a morte é provocada atendendo a uma vontade do paciente, que deve ser exprimida pelo mesmo após aconselhamento profissional, de modo a certificar-nos que esta é ponderada e informada.
Uma tese apresentada por alguns opositores da eutanásia defende que, como a autonomia só existe quando a pessoa age moralmente, e como o exercício da autonomia é contrário à eutanásia voluntária e ao suicídio assistido, que estes são imorais. David Oderberg define autonomia como a capacidade de tomar decisões individuais à luz de leis universais encontradas pela razão, seguindo a moralidade definida por Immanuel Kant.
Mas será que isto justificará a imoralidade da eutanásia? Oderberg fundamenta-o nos seguintes termos:
1. Não podemos desejar racionalmente que a máxima “Devo encurtar a minha vida se dela esperar mais desgraças que alegrias” se transforme em lei da natureza;
2. Matar uma pessoa para lhe aliviar o sofrimento é sempre tratá-la apenas como mero meio e não como um fim.
Em relação primeiro argumento, creio que aceitaríamos – embora Kant recusasse, certamente -  a universalização de uma formulação diferente da mesma máxima: ‘Devo respeitar a autonomia da vontade daqueles que desejem encurtar a sua vida, quando apenas podem esperar dela sofrimento, no presente e no futuro.’
Em relação ao segundo argumento, Oderberg diz-nos que tratamos uma pessoa como meio e não como fim quando lhe terminamos a vida para aliviar o seu sofrimento. Não concordo com este argumento pois ao terminar a vida da pessoa em sofrimento, temos em mente o bem-estar da mesma, sendo este o verdadeiro fim da nossa ação. Sendo assim, tomamos como meio a ação de matar, com a finalidade de restaurar o bem-estar à pessoa, ou o fim do sofrimento, em casos que este seja apenas possível após a morte da mesma.

Oderberg conclui ainda que, se praticar a eutanásia é um ato imoral, realizá-lo é contrário à autonomia da pessoa. E que, se queremos respeitar a sua autonomia, devemos condenar qualquer forma de morte a pedido, em vez de anuir cegamente a quaisquer solicitações que nos possam fazer.
Ora, eu proponho uma refutação a este argumento, considerando que a conclusão a que Oderberg chegou é contraditória com o princípio antes estabelecido.  Senão, vejamos: ele define autonomia como capacidade de tomar decisões individuais à luz de leis universais encontradas pela razão e defende que respeita a autonomia de um sujeito ao condenar o pedido ponderado e informado do mesmo.  Ora, parece-me que não respeitar uma decisão racional e ponderada, de um dado sujeito, significa não respeitar a sua autonomia.
Considero que a prática da eutanásia voluntária permite respeitar a autonomia, isto é, a capacidade de alguém tomar decisões, por si e para si mesmo, de alguém num estado de saúde crítico, não sendo este, no entanto, condicionante da sua autonomia.
Ao atender ao pedido repetido de alguém que, ainda que racional, não pode agir tendo em conta o seu estado de saúde, estamos a respeitar a pouca autonomia que esta pessoa ainda detém.

Em suma, o tipo de eutanásia que defendo é a eutanásia voluntária, na qual a morte é provocada atendendo a uma vontade do paciente, que deve ser exprimida pelo mesmo, após aconselhamento profissional, de modo a certificar-nos que esta é racional, ponderada e informada, devendo, portanto, esta sua última vontade deve ser respeitada. Assim sendo, considero que não há qualquer razão na tese proposta por Oderberg, que justifique a imoralidade desta prática.

Margarida Sardinha, 10ºB

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