David: Já leste os textos recomendados?
Ana: Claro! achei-os muito interessantes. Kant é mesmo um filósofo genial.
David: Explica lá então, por que razão não nos satisfazemos com as limitações do nosso conhecimento?
Ana: Como sabes, Kant defende que só podemos conhecer o que podemos intuir. Tudo começa com a intuição dos objectos no espaço e no tempo - as formas ou estruturas da sensibilidade. Por consequência, só intuímos realidades empíricas, aquelas que podemos perceber naquelas estruturas.
David: Estou a ver. Podes dar um exemplo?
Ana: Ouviste aquela moto que passou? A moto provocou em nós uma certa impressão, nós conseguimos situar o barulho e a visão da moto num certo espaço (a rua) e num certo tempo (dezasseis horas e cinco minutos). Só podemos intuir objectos que estejam no espaço e no tempo.
David: Pois... sendo assim, a sensibilidade desempenha um papel muito importante no conhecimento.
Ana: Claro! mas não é suficiente. Para haver conhecimento é preciso que o entendimento entre em cena. Por isso podemos dizer que todo o conhecimento começa com a experiência mas não deriva dela. A sensibilidade recebe as impressões e estabelece entre elas uma relação espácio-temporal mas não sabe explicar a razão, não estabelece uma relação de causa-efeito. Esta parte cabe ao entendimento.
David: Podes dar um exemplo?
Ana: Consideremos duas impressões sensíveis: o aumento da temperatura e a dilatação de um corpo. A sensibilidade recebe as impressões e estabelece uma sucessão temporal desconhecendo que estão necessariamente ligadas. Isto só acontece quando o entendimento aplica o conceito de causa, o qual permite estabelecer relações de dependência entre estes dois fenómenos. O conceito de causa é uma forma ou estrutura além de outras, com as quais o entendimento humano está equipado. Kant chama-lhes conceitos a priori ou categorias do entendimento.
David: Muito interessante. Continua.
Ana: Só podemos conhecer os dados sensíveis, os fenómenos. Mas pensar é diferente de conhecer. Nada nos impede de pensarmos noutras realidades, os númenos. O conhecimento é condicionado e limitado, mas isso não exclui a existência de uma realidade que não podemos conhecer. A realidade não se reduz ao mundo dos fenómenos, aos objectos que podemos conhecer estabelecendo relações de causa e efeito pelo entendimento. É legítimo pensar que existe muito mais.
David: É por isso que a nossa razão é por natureza insatisfeita, com vontade de conhecimento absoluto...
Ana: Isso mesmo, exige que continuemos além do condicionado e que procuremos a causa incondicionada - a causa última - independentemente da sua existência ou, da possibilidade de a razão a alcançar.
David: "Conhece como se fosse possível atingir o conhecimento absoluto"...
Ana: É isso tudo. A razão "empurra" o entendimento levando-o a estabelecer relações causais entre os fenómenos como se fosse possível prolongá-las até encontrar a causa incondicionada. Mas isso implicaria a possibilidade da razão conhecer além da realidade espácio-temporal, o que claramente não é possível. Contudo, a razão insatisfeita, procura incessantemente decifrar o enigma que é o universo na sua totalidade.
2 comentários:
Pegando neste diálogo, julgo que apenas me resta acrescentar, como que em nota de rodapé,o seguinte: quem sabe muitas respostas não conhece, na verdade, nem a ponta do seu dedo. Está toda a gente tão embrenhada em decorar respostas e ensinar respostas, que, no fim, se descuram as questões verdadeiramente importantes - poucos se empenham em fazer perguntas, claro que assim o homem nunca sairá do plano materialista e obtuso em que vive, nunca a razão manifestará insatisfação, ou seja, nunca a razão será como foi feita para ser: insaciável e incansável.
Obrigada Ana, concordo plenamente com o teu post sricptum.
Vivermos tão apressados que, a maior parte das vezes não alimentamos a nossa natural insatisfação, esgotando-nos nas aparências.
Muito sucesso.
Cump.
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